Porque não existe uma Igreja verdadeira
- Izequias Rafael Amade
- 28 de jul. de 2019
- 3 min de leitura
Atualizado: 8 de set. de 2019
O fenómeno do divisionismo no cristianismo vem desde os seus primórdios. Desde o primeiro século existiram seitas. Assim sendo, surge a questão, qual denominação seria a certa? Existe uma denominação realmente baseada nos ensinamentos de Jesus? A resposta honesta é não, não existe uma Igreja verdadeira.
O principal ponto para a impossibilidade de existência de uma igreja verdadeira, isto é, baseada nos ensinamentos de Jesus, é o facto de não haver uma igreja que existe desde os tempos de Jesus e seguida por seus discípulos. Todas as seitas do período pré-católico já não existem no período pós-católico, o que significa que o que se tinha como verdade antes do catolicismo não é o que se tem como verdade após o catolicismo. Logo se existia uma igreja verdadeira nos primeiros séculos, essa igreja já não existe nos nossos dias, pois os conceitos do cristianismo actual são diferentes dos conceitos do cristianismo dos primeiros séculos.
As visões cristológicas do cristianismo primitivo são diferentes e são muitas. Existiam os docetas, que acreditavam que o corpo de Jesus era uma ilusão, portanto, não estava na sua forma física. Também haviam os ebionitas, que eram um grupo judaizante. Os ebionitas acreditavam que Jesus veio restaurar a torah e que o seu cumprimento ainda estava em vigor, motivo pelo qual consideravam Paulo um apóstata. Os Essénios foram também um grupo com uma visão diferente de Jesus, porém, era uma visão muito apocalíptica, pois acreditavam que o mundo iria acabar naquela época. Já os Alexaítas acreditavam que João Baptista era o Messias, não Jesus. As seitas são inúmeras, essas são apenas algumas.
E, também, é por conta dessas diferentes visões cristológicas que diferentes evangelhos foram escritos, cada um escrevia segundo os seus conceitos. E podes ver que, nos evangelhos canónicos, os escribas tentam combater outras seitas ao escrever coisas contra as outras visões. Temos como exemplo uma passagem da Carta de João que, com a tentativa de combater os docetas que acreditavam que Jesus não veio na forma física, escreveu o seguinte:
“Amados, não creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus, porque já muitos falsos profetas se têm levantado no mundo. Nisto conhecereis o Espírito de Deus: Todo o espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; E todo o espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em carne não é de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual já ouvistes que há-de vir, e eis que já agora está no mundo.” [1 João 4:1-3]
Também para combater a mesma ideologia, fez-se um acréscimo posterior, provavelmente feito por Marcião, no Evangelho de Lucas:
“Observai as minhas mãos e meus pés e vede que Eu Sou o mesmo! Tocai-me e comprovai o que vos afirmo. Por que um espírito não tem carne nem ossos, como percebeis que Eu tenho.” [Lucas 24:39]
Isso é mostra que quase ninguém tinha uma narrativa real acerca de Jesus. As pessoas já tinham perdido a essência da sua mensagem. Como consequência surgiram diversos evangelhos com um Cristo diferente, uma vez que eram escritos tendo em conta com a visão da seita do autor.
O mais problemático ainda, é que ao passar do tempo a cristologia e os dogmas foram evoluindo e as antigas visões cristológicas foram sendo extintas. Nenhuma visão cristológica dos primeiros séculos vive até hoje. Toda visão actual é oposta às do período primitivo.
Se existia um cristianismo verdadeiro nos primeiros séculos implica que o cristianismo actual não seja verdadeiro, pois se opõe ao antigo. Hoje só há verdadeiro cristianismo se e só se existir a trindade. E no caso do catolicismo também tens que aceitar os santos e venerar Maria, logo o cristianismo primitivo estava errado. O cristianismo só veio a ser verdadeiro após o catolicismo, o que não faz sentido.
Outro problema tem a ver com a reforma protestante. Ao fazer-se uma reforma entendemos que o antigo sistema não era adequado, isto é, o cristianismo estava errado por aproximadamente 12 séculos. É o que os protestantes fazem-nos entender. Nesse caso saíram do cristianismo e formaram outro cristianismo. Em cada época se encontra um conceito de cristianismo diferente e os seus adeptos convencem-se de que é a verdade absoluta. Para os cristãos primitivos o cristianismo verdadeiro era o que eles acreditavam e na nossa era as pessoas têm por cristianismo um conceito diferente do que se acreditava ser a absoluta verdade no período primitivo. O que vem a ser verdade no cristianismo uma vez que as verdades estão sempre a mudar?
Não temos um cristianismo verdadeiro na nossa era, pois são conceitos que vieram depois dos outros. Portanto, a veracidade dos conceitos primitivos implica a falsidade dos actuais, e a veracidade dos actuais, se fosse possível, implica a falsidade dos antigos. E para não esquecer, a trindade também é um dos conceitos cristológicos inventados mais tarde, da mesma forma que os outros foram também inventados, qualquer cristão que conhece história sabe que a trindade é um conceito oficializado pela igreja.

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